quarta-feira, 28 de outubro de 2015

SEMANA DA REFORMA - AS INDULGÊNCIAS DO PAPA LEÃO X





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Rev. João d’Eça, MD



Introdução

         O papa Leão X proclamou a venda das indulgências[1] em toda a Europa e escalou um monge dominicano de nome João Tetzel para vende-las na Alemanha e arrecadar o maior número possível de dinheiro para Roma, cujo intuito era: 1) Pagar o empréstimo feito junto a banqueiros, e 2) arrecadar para a construção da basílica de São Pedro. As indulgências foram arrendadas por Alberto, arcebispo de Maiz, e Lutero se levantou contra esse comercio nefasto, dando assim início à Reforma protestante.

O papa Leão X dizia que as indulgências constituíam uma grande graça. O objetivo dessa venda era alcançar as grandes massas das populações por toda Europa. O clero apresentava ao público, mas também eram apresentadas por aqueles que queriam ganhar simpatia do alto clero do romanismo.

Muitos príncipes da Alemanha não viam com bons olhos o trabalho de João Tetzel e reclamavam da exploração por parte do papa das suas populações já muito empobrecidas. Nos seus territórios já estavam se esgotando as moedas que iam para enriquecer a coorte papal. Muitos homens de bem e muitos padres não viam com bons olhos a venda dessas indulgências, pois além de empobrecer o povo, traziam consigo muitos outros males para a sociedade.



Indulgências do papa Júlio

Em 1501 o papa Júlio promulgou uma indulgência com o propósito de auxiliar no custeio de uma guerra contra os turcos, em suposta defesa do cristianismo. O eleitor Frederico não permitiu que o dinheiro levantado nos seus domínios saísse do país, porque pretendia guardar essas somas até que a guerra fosse declarada. Começou ai a oposição de Frederico aos desmandos do papado.


Esse dinheiro que Frederico não permitiu que saísse dos seus domínios, foi empregado na construção da Universidade de Wittemberg, onde o jovem Lutero estudou, afixou na porta da catedral as 95 teses e onde ele foi professor.

Primeiros protestos contra as indulgências

João Wessel também protestou contra as indulgências, mas o seu protesto serviu apenas para que ele fosse morto na prisão em um claustro dominicano.

Esses primeiros protestos por mais veementes que fossem não atingiram contudo, a alma do negócio; a consciência popular, não foi despertada, o povo em sua maioria, ignorante, com medo e submisso ao papa, recebia as indulgências com o propósito declarado por Leão X.

Com o montante aumentando sempre, o papa dizia agora que os recursos seriam para construir a “Casa de São Pedro”, e ainda, pretendia levantar um túmulo sobre os ossos do grande apóstolo, que alegavam estar em Roma.

Ignorância espiritual

As pessoas mesmo não sabendo que fim levava o dinheiro arrecadado, não se inquietavam por ter de tirar o dinheiro de suas algibeiras e entregar ao representante do papa que viajava por toda a Alemanha e era recebido com festa. Digno de destaque é o testemunho de uma testemunha ocular, Myconius[2], que ainda menino, com treze anos de idade, conta o que testemunhou:


Quando o vendedor de indulgência aproximava-se de qualquer cidade, na sua frente, um pano de veludo e ouro, era carregada a bula papal que a anunciava. Todos os padres e monges, o concílio, mestres de escola com os estudantes, homens, mulheres, com bandeiras, velas e cânticos, em grande procissão, saiam ao seu encontro. A multidão acompanhava-o À principal igreja; todos os sinos retiniam, todos os Órgãos soavam. No meio da igreja erguiam uma grande cruz vermelha e desfraldava-se a bandeira papal. O povo parecia estar recebendo a Deus em pessoa.

Desse entusiasmo pelas indulgências, Alberto de Brandenburgo, outrora arcebispo de Magdenburgo, e nesse tempo arcebispo de Maiz, pensava em obter alguma vantagem. Ele ainda muito jovem, era afeito à ostentação e considerado protetor das ciências, era interessado no humanismo e apreciava as artes, principalmente a pintura.

Para chegar onde chegou, Alberto gastou muito dinheiro comprando cargos e prometendo ao clero que iria pagar todas as despesas quando recebesse o seu segundo pallium[3] arquiespiscopal; além disso, devia grandes somas ao grande banco de Augsburgo e se achava em sérias dificuldades financeiras.

Por causa dessa dificuldade, Alberto persuadiu ao papa que lhe arrendasse as indulgências na maior parte da Alemanha e foi ele quem assalariou o dominicano João Tetzel, anteriormente comissário do papa para ser seu próprio comissário.

Blasfêmias papais

Para atrair a clientela das indulgências, o próprio arcebispo fez a lista dos supostos benefícios que os compradores alcançariam, e, Tetzel usou essa lista como um texto no qual ele podia acrescentar o que quisesse para convencer o populacho a comprar a mercadoria que eles estavam oferecendo, ou seja, títulos de propriedade do céu.

A lista dos supostos benefícios incluía:

         1 – Assegurava ao comprador um completo perdão de todos os pecados, participação na graça de Deus e livramento do purgatório;

         2 -  Concedia ao possuidor de um documento com o selo papal, o direito de escolher o confessor que lhe agradasse, o qual devia absolve-lo sem confissão de crimes e castigos, e lhe permitia ainda mudar qualquer voto penoso em outro mais ameno e agradável;

         3 – Tornava-o participante de todas as obras da igreja universal, de todos os benefícios das orações, romarias e outras obras eclesiásticas efetuadas por todos os membros da igreja em geral;

         4 – Por fim, provia-o de uma plena remissão de pecados as almas que se achavam no purgatório.



João Tetzel porém, ampliou em muito estas instruções. Ele bradava por onde passava:

- “A alma voa do purgatório assim que a moeda tilinta no fundo da caixa.”

- “A cruz vermelha da indulgência tem o poder igual ao da cruz de Cristo.”

- “As cartas papais tem uma eficácia tal que absolveriam mesmo o homem que tivesse violado a mãe de Deus.”

As blasfêmias de João Tetzel nem se comparavam às blasfêmias ditas pelo papa Leão X, ao declarar que alguns pecados não poderiam ser perdoados, mesmo pelas indulgências. Eram eles:


         1 – Conspiração contra a pessoa do papa;

         2 – Assassinato dos bispos e de outros prelados superiores;

         3 – Falsificação de cartas apostólicas;

         4 – Transporte de armas e outros objetos proibidos para países pagãos;

         5 – As sentenças e censuras de importar dos países pagãos, “pedra-hume” da apostólica Tolfa, contrariamente às proibições apostólicas.

A explicação dessa quinta proibição era: “Toda pessoa que importasse pedra-hume na cristandade era culpada de pecado imperdoável.” A explicação disso era a seguinte: Um certo homem chamado Giovani di Castro tinha descoberto nas montanhas de Tolfa[4] domínio do papa, não longe da Civitá Vechia (cidade velha), uma mina de pedra-huma e mina de riqueza para a santa sé.

Di Castro certificou-se de sua descoberta calcinando a pedra. Depois apresentou-se ao papa e disse:


Vou anunciar-vos uma vitória sobre o Turco. Ele tira anualmente dos cristãos 300.000 peças de ouro que lhe são pagas pela pedra-hume com que tingimos a lã; pois não temos senão um pouco perto de Isckia... Eu achei sete colinas tão abundantes em pedra-hume que poderiam abastecer sete mundos. Se quiserdes mandar trabalhadores a fazer fornos para calcinar a pedra, podereis fornecer pedra-hume a toda a Europa e o ganho que com esse artigo obtinha o Turco virá para a vossa mão.

A santa sé apressou-se em explorar seus tesouros recentemente achados, e, com o fim de assegurar a totalidade do proveito para si, declarou um pecado importar qualquer quantidade de pedra-hume na Europa.

A moeda obtida com a venda das indulgências de modo algum devia interferir com as rendas papais provenientes de suas minas de pedra-hume, e dessa forma, a importação de pedra-hume foi declarada um pecado imperdoável por qualquer indulgência.


[1] INDULGÊNCIAS: Venda de títulos de propriedade do céu. Quem comprasse as indulgências teria todos os seus pecados perdoados, fossem eles passado, presentes ou futuros e poderiam ainda ser de entes queridos jáfalecidos. Um dito de João Tetzel era: “Quando a moeda tilintar no fundo do baú, mas uma alma sairá do purgatório rumo ao paraíso.”
[2] OSWALD MYCONIUS: Nasceu em Lucerna, Suíça. Seu nome de família era Geisshüsler, e seu pai era um moleiro. O nome Myconius disse ter sido dado a ele por Erasmus de Roterdã; faz alusão à expressão proverbial Myconian “careca”. Da escola em Lucerna ele foi para a Universidade de Basel para estudar clássicos. A partir de 1514 ele obteve postos de ensino em Basileia, onde se casou, e fez o conhecimento de Erasmus e de Hans Holbein, o pintor. Em 1516 ele foi chamado, como mestre-escola, para Zurique, onde (1518) ligou-se ao partido reforma de Zwingli. Isso o levou a ser transferido para Lucerna, e outra vez (1523) reintegrado em Zurique. Entre seus vários tratados, o mais importante é De H Zwinglii vita et obitu (1536), traduzido para o Inglês por Henry Bennet (1561).
[3] PALLIUM ou PÁLIO: Símbolo de autoridade jurisdicional oferecido pelo papa a um príncipe ou soberano.
[4] Montanhas de Tolfa: Próximo a Roma, usado para caminhada de turistas.

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