terça-feira, 29 de dezembro de 2015

O CARÁTER E O CUMPRIMENTO DA LEI

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Rev. João d'Eça


         No reinado de Frederico[1], o Grande havia um moinho perto de Pastdam que impedia a bela visão das terras, à partir das janelas de Sans-Souci, residência real. Incomodado com a situação, o rei mandou perguntar ao proprietário por quanto venderia sua propriedade. O dono do lugar respondeu aos emissários do rei, que não venderia por dinheiro nenhum. O rei enfurecido ameaçou mandar demolir o moinho.
 
- O rei pode fazer isso se quiser, respondeu o proprietário; mas saiba o rei que na Prússia existem leis e eu recorrerei à justiça contra o monarca, se este persistir na sua intenção.
 
O rei constrangido teve a sabedoria e a coragem de dizer aos seus cortesãos:
 
- Muito me alegro de saber que em meu reino há leis sábias e juízes retos nos quais o povo pode confiar.
 
Passaram-se os anos, e tanto o rei como o proprietário daquelas terras foram sucedidos por seus herdeiros. Um dos herdeiros do moleiro, dono daquele moinho, conhecedor do que havia acontecido com os seus antepassados, achando-se agora em crise financeira por causa de perdas que havia sofrido com a guerra, escreveu ao novo rei que estava no trono, herdeiro do antigo do tempo daquele moleiro, lembrando-lhe da questão e dizendo-se disposto e vender as terras com o moinho para esse novo rei, dizendo ainda que aguardava a resposta com a oferta.
 
- “Meu querido vizinho”, disse o rei – “Não posso permitir que você venda o moinho, ele deve continuar na posse de sua família enquanto existir um membro dela, porque esse patrimônio pertence à história da Prussia. Lamento no entanto que você esteja passando por dificuldades financeiras, e portanto estou lhe enviando uma considerável quantia para que você acerte os seus negócios e pague as suas despesas, esperando que a quantia enviada seja o suficiente. Considere-me o seu afetuoso vizinho: Frederico Guilherme.[2]
 
No Brasil as coisas não passariam assim. Seria outra a narrativa a fazer e os fatos a serem registrados seriam completamente diferentes.
 
Se o caso não acontecesse com a presidente da República ou com o Governador, ou ainda com o Prefeito da cidade, mas simplesmente com um juiz, com um deputado, ou com um grande empresário, o proprietário seria despejado de sua propriedade e, se se desse ao luxo de protestar e entrasse com uma ação na justiça, arriscava-se a ser assassinado por emboscada, ou ainda a ter o seu processo alongado em tempo que talvez os seus bisnetos obtivessem a sentença, ou como é mais plausível, o poder financeiro compraria a sentença de juízes corruptos e inescrupulosos, que para agradar à autoridade ou ao empresário, venderia a sentença sem dor na consciência.
 
Será que estamos sendo pessimistas, ou tratando o nome do nosso país com desamor? Ao contrário, eu amo o meu país e tenho desejo de vê-lo regenerado e debaixo da obediência às leis por parte de todos os seus cidadãos, indistintamente. Os fatos, porém, nos autorizam a falar assim.
 
Uma presidente que governa o país, que comete crimes para enriquecimento de seus apoiadores (e é claro, dela própria!), onde a justiça não faz justiça, onde o corporativismo e a venda de sentenças são a praxe, onde as negociatas visando livrar o pescoço dos criminosos envolvidos, é tão comum quanto tomar um cafezinho às tardes.
Não somos pessimistas. Hoje, em todos os recantos do Brasil, prega-se o Evangelho do Salvador Jesus Cristo, e nós cremos em seu poder regenerador. Oramos e trabalhamos pela regeneração de nossos costumes, e estamos certos, não será em vão o nosso trabalho.


[1] Frederico Guilherme (Nasceu em Berlim, 24 de janeiro de 1712 – Morreu em Potsdam, 17 de agosto de 1786), também chamado de Frederico, o Grande, foi o Rei da Prússia de 1740 até sua morte. Ele é mais conhecido por suas vitórias militares, sua reorganização do exército prussiano, patronagem das artes e o iluminismo na Prússia.
 
[2] Frederico Guilherme II (nasceu em Berlim, 25 de setembro de 1744 – morreu em Potsdam, 16 de novembro de 1797) foi o Rei da Prússia de 1786 até sua morte. Por união pessoal, também era Eleitor de Brandemburgo e o príncipe soberano de Neuchâtel. A Prússia enfraqueceu durante seu reinado e ele não conseguiu lidar com os desafios criados com a Revolução Francesa. As políticas religiosas de Frederico Guilherme iam diretamente contra o iluminismo e tinham a intenção de restaurar o protestantismo tradicional. Entretanto, foi patrono das artes e responsável pela construção de importantes edifícios, dentre eles o Portão de Brandemburgo.

Um comentário:

Unknown disse...

Oportuna reflexão caro Rev. d'Eça. Estamos a anos luz de alcançarmos o padrão de civilidade da antiga Prússia menos ainda dos países desenvolvidos.

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