sábado, 11 de novembro de 2006

VOVÔ.

Por Pr. João d'Eça Não tive o privilégio de ter um avô por muito tempo. Meus avós morreram enquanto eu ainda era muito pequeno, dos três aos cinco anos. O meu único avô que conheci foi o vovô Pedro, homem forte, robusto, cheio de vida e que me deixava brincar no seu colo. Ele viveu comigo até os meus doze anos, e, lembro da tarde em que ele morreu, após um tempo prostrado, acometido por Trombose. Foi um dia doloroso para a minha alma de criança que não entendia muita coisa à respeito. Quando eu tinha quatro anos vovô começou a me ensinar algumas canções folclóricas da sua época de menino. Não havia acompanhamento, mas os seus pés, calçados com chinelos de couro, marcavam o tempo, enquanto as suas mãos batendo palmas, marcavam a cadência das notas. Na minha imaginação, eu era violinista, pianista, baterista e me imaginava tocando outros instrumentos com um acompanhamento mais vibrante e mais maravilhoso do que qualquer orquestra sinfônica da vida real. Os anos passaram rapidamente. No ano em que fiz 10 anos, vovô já estava com 74, mas sempre dava-me algo de presente, simples, mais muito importante para mim, geralmente era um carrinho que me dava muita alegria quando brincava nas tardes sombreadas da calçada da frente da nossa casa. No ano em que completei 11 anos, ele sofreu o primeiro derrame, foi horrível ver o aspecto do seu rosto deformado. Porém com o passar dos meses e o tratamento feito, ele foi melhorando, a ponto de poder ainda caminhar pela casa e voltar a viver quase que normalmente como antes, mas com inúmeras limitações. Lembro quando numa manhã, já com doze anos de idade, antes de sair para a escola, fui ver vovô no seu quartinho, ele ainda estava deitado, perecia sentir-se mal. Fui até ele e pedir-lhe a benção. Ele me abençoou desejando-me uma boa aula, e me disse: - talvês você não me encontre mais aqui quando voltar. Sem dizer uma só palavra fui para o colégio preocupado. Seria melhor se eu não o tivesse encontrado mais em casa, mas encontrei, e a imagem nunca mais sairá da minha memória. Meu avô havia sofrido um outro derrame naquela manhã e quando voltei da escola ainda o encontrei nessa situação. Minha mãe e minha tia tentavam encontrar um jeito de leva-lo ao hospital, o que aconteceu com a chegada do meu pai. Daí pra frente só lembro de suas palavras para mim: “- quando eu morrer e o chamarem, não venha. Nunca estarei longe de você, mas talvês você não acreditasse nisso se me visse morto”. Eu segui à risca esse conselho de vovô, tanto é que não lembro dele morto ou de outras pessoas queridas. Faço questão de lembrar delas enquanto vivas, isso é melhor pra mim. Mesmo como pastor que tem de realizar cultos fúnebres, não costumo olhar para o corpo no caixão. É muito melhor lembrar de alguém vivo. As lembranças que tenho do meu avô são belas lembranças de uma criança que se apega ao pai do seu pai ou da sua mãe, e que o considera como um outro pai, mais presente, mais carinhoso, mais atencioso e que lhe proporciona momentos mágicos, tanto de brincadeiras quanto de descanso no colo macio, ou de lindas histórias e estórias contadas que nos aquecem o coração. Deus nos deu uma coisa muito especial, uma afinidade que dá a poucas das suas criaturas. Meu avô morreu quando eu tinha doze anos, mas até hoje ele cumpriu a sua promessa, ele está próximo de mim, nas minhas lembranças, na minha memória, nos meus pensamentos de saudade. Vejo-o nitidamente como em um vídeo-tape, relembro das tardes de brincadeiras com meu avô na calçada de casa e isso me faz um bem gratificante, obrigado vovô.

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