LUTERO
E A DIETA DE WORMS
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Rev.
João d’Eça
O
Imperador Carlos V convocou uma dieta do império para o ano de 1521, e pediu ao
eleitor do império germânico da Saxônia, Frederico, o sábio que também
trouxesse Lutero, afim de que fosse decidida a sua causa. Frederico respondeu
que o dispensassem, porque não esperava nada de bom para Lutero.
Mas
este declarou:
-
“Sendo convocado, quero até ser conduzido doente, caso não possa ir em estado
de saúde; pois não há dúvida que convocando-me o Imperador, seja convocado por
Deus. Não se pode reparar nem em perigo, nem em bem estar.”
Logo
depois, recebeu com muito gosto do Imperador a intimação de aparecer em Worms
no prazo de 21 dias, e, ao mesmo tempo, a promessa duma escolta livre. O
magistrado de Wittenberg deu-lhe uma carruagem para a viagem, e o eleitor
Frederico arranjou-lhe para guarda um arauto especial. Acompanhado de quatro
amigos e o arauto, Lutero seguiu animado a sua viagem de Wittemberg. Em toda
parte, ajuntava gente para ver o homem ilustre do qual se falava tanto.
De
Erfurt vieram-lhe ao encontro, de uma distância de duas léguas, quarenta
cavaleiros e muitas pessoas a pé, afim de o acompanhar honrosamente à cidade. E
nas mesmas estradas, onde ele tinha passado antes como monge, com o alforje, a
multidão o recebeu com júbilo. Insistiram tanto que ele pregou para uma enorme
multidão.
Quando
o aconselharam a não ir a Worms, porque lá seria reduzido a pó, respondeu:
-
“Ainda que façam uma foqueira de Wittenberg a Worms até o céu, em nome do
senhor quero aparecer.”
Em
Oppenhein ele recebeu uma carta de Spalatin (o qual acompanhara o seu amo à
dieta) com a advertência de não se expor a tal perigo, em Worms; mas o brioso
Lutero mandou lhe dizer:
-
“Ainda que houvesse tantos demônios em Worms, como telhas nas casas, lá queria
entrar.”
No
dia 16 de abril ele chegou. Uma grande multidão foi-lhe ao encontro, Uns a pé,
outros à cavalo e outros a carroça. Na cidade apertavam-se ao redor de sua
carruagem, mais de dois mil homens.
Já
no dia seguinte, as quatro horas da tarde, o marechal veio busca-lo para a
dieta do reino. O aperto diante da sua casa era tão grande (até os telhados
estavam ocupados), que o marechal teve de passar por algumas casas e jardins.
Na
porta do salão estavam alguns fidalgos cavaleiros. Um deles, Georg Frundsberg,
um guerreiro disposto, bateu-lhe no ombro dizendo:
-“Fradinho,
fradinho, agora vais por um caminho, que nem eu nem outro superior passamos na
ordem de batalha mais séria.”
-
“Estás intimamente persuadido e certo de tua causa? Então continua em nome de
Deus, e tem confiança de que Deus não te abandonará.”
Estas
palavras elevaram muito o seu ânimo; o seu coração bateu mais forte, quando ele
agora pensou que tinha de defender a sua doutrina perante o rei e o reino.
Abriram-se
as portas do salão e ele ousadamente entrou. Mais de cinco mil pessoas, que
estavam na sala, na antessala, e nas janelas, olharam para ele e só para ele,
num momento, e, diante de si, ele viu, no final da sala o Imperador Carlos, no
hábito solene imperial, assentado no seu trono e diante deste, em duas extensas
fileiras, os eleitores, príncipes e condes do reino alemão. Mas dos olhos da
maior parte irradiava interesse e admiração, e aqueles que estavam mais perto,
lhe cochichavam, aconselhando-o a se animar e anão temer os que só podem matar
o corpo.
Então,
o marechal do império, passou à sua frente e perguntou-lhe se reconhecia como
seus os livros que estavam em cima da mesa. E quando ele respondeu que sim,
perguntou-lhe o marechal se queria revogar as opiniões que continham aqueles
livros. A última pergunta parecia surpreendê-lo. Em seguida pediu prazo para
deliberar, o qual o Imperador lhe concedeu.
Quando
ele saiu reconheceu que não seria fácil defender a sua causa perante o rei e o
reino. Mas o pensamento no auxílio de Deus, o qual se expressa tão eficaz em
seu maravilhoso hino: “Castelo Forte” deu-lhe novo ânimo para defender a
verdade sem acepção de pessoas.
No
dia seguinte, quando ele compareceu, todos estavam interessados em extremo pela
sua resposta decisiva. Desta vez tinha de esperar por duas horas na ante-sala.
Quando ele entrou às seis horas, já ardiam os archotes; também no seu coração
ardia a inspiração de confessar francamente a verdade.
Ele
então começou:
-
“Excelentíssimo imperador, ilustríssimos eleitores, príncipes e senhores.
Compareço obediente no prazo que me foi concedido ontem de tarde e peço pelo
amor de Deus que vossa majestade e excelências queiram atender
misericordiosamente a esta causa justa e verdadeira, como eu espero, e queiram
perdoar-me se eu por ignorância não der o título próprio a cada um, e, além
disso, não me comportar conforme o uso na corte, pois tenho passado sempre no
convento e nunca na corte.”
-
“Quanto a mim não me posso manifestar de modo diverso do que tenho escrito e
ensinado com simples coração até agora e somente tenho procurado e considerado
para a honra de Deus e proveito e salvação dos crentes em Cristo, afim de que
fossem instruídos na verdade e pureza.”
Depois
ele explicou-se com sinceridade sobre os seus livros. Tudo isto falou ele em
alemão. Então lhe fizeram lembrar que o Imperador entendia o alemão com dificuldade.
Em seguida repetiu todas as palavras em língua latina, apesar de que suava
muito por causa da multidão e porque estava muito perto dos príncipes.
Por
fim o interrogou um clérigo distinto, dizendo que desse uma resposta direta e
resumida: se queria revogar ou não. Lutero disse:
-
“Bom, desde que a majestade imperial e os senhores eleitores e príncipes requerem
uma resposta simples e resumida, quero dar esta que não há de ter nem chifres
nem dentes, a saber: Desde que não seja vencido e convencido por testemunhos da
Santa Escritura, ou por públicas, claras e compreensíveis razões e bases, não
quero e nem posso revogar nada, porque não é nada seguro e nem conveniente
fazer qualquer coisa contra a consciência. Aqui estou, não posso proceder de
outra maneira. Deus me ajude! Amém!”
Esta
sincera declaração fez uma extraordinária e favorável im pressão nos príncipes e
outros auditores; até mesmo o imperador disse:
-
“O frade fala desembaraçado e com o coração confiado.”
Frederico,
o sábio gostou especialmente de Lutero. – “Oh como falou bonito!” Disse ele ao
seu pregador da corte chamado Spalatin.
Ainda
na mesma tarde, o velho Rodrigo, duque de Brunsvico, apesar de ser um católico
zeloso, mandou a Lutero um jarro de prata com cerveja especial, a fim de se
refrescar. Também vários príncipes visitaram Lutero na sua residência, diante
da sua casa sempre havia gente, que o queria ver.
Somente
o papa e os seus representantes legais na reunião, empregavam o céu e o inferno
para arruiná-lo, e para levar os príncipes a declará-lo proscrito e herege.
O
eleitor de Treveris experimentou mais uma vez fazê-lo revogar os seus escritos,
mas Lutero deu-lhe uma linda resposta:
-
“A obra sendo de homens, perecerá; mas sendo de Deus, permanecerá.”
A
consequência e o caminhar da história, mostrou que a sua obra é obra de Deus.
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